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SEGUNDA-FEIRA, 25 DE ABRIL DE 2016 - Horário 15:27

Pais estrangeiros são alvos de dificuldades no Brasil
Governo / O Mundo vem vivenciando uma internacionalização das relações. Uma consequência desta movimentação sociológica é um número cada vez maior de "famílias internacionais". Das uniões entre brasileiros e brasileiras com estrangeiros, situação mais e mais frequente, naturalmente também é comum que surjam filhos, que estarão, portanto, constituindo o que seria uma "família internacional".

Muitas pessoas possuem dúvidas a respeito de como funciona a lei brasileira na regulação de famílias internacionais. Pais estrangeiros e seus respectivos cônjuges brasileiros ficam às vezes com dúvidas em como proceder ou quais direitos ou deveres podem recair sobre os mesmos.

O primeiro aspecto que merece destaque diz respeito a nacionalidade do menor que acabou de nascer. Muitas vezes, quando o menor nasce no Brasil, os pais não devem esquecer que a sua nacionalidade estrangeira também pode ser reconhecida, pois a lei brasileira não cria empecilhos para tal. Não há perda de nacionalidade brasileira pelo reconhecimento de outra nacionalidade, se originária. Como cada país possui uma legislação e procedimento diferente, é comum que essa questão seja resolvida tranquilamente nos respectivos consulados estrangeiros localizados pelo Brasil. E como funciona quando a criança, filha de brasileiro, nasce no exterior?

A dúvida acima é respondida pela nossa Constituição Federal. Neste caso, deve-se registrar o menor em um consulado brasileiro mais próximo. Caso isso não seja feito, ainda é possível que o menor adquira a nacionalidade, bastando que o mesmo, a qualquer tempo depois que atingir a maioridade, venha a optar pela mesma.

Outro ponto importante a ser considerado são os direitos que o estrangeiro possui em relação ao seu filho. A legislação brasileira pertinente ao Direito de Família garante também ao estrangeiro o direito ao amplo exercício do poder familiar do mesmo sobre a sua prole. Essa garantia de direitos também envolve o acesso direto à criança para que possa vê-la e interagir com a mesma de forma constante, podendo sempre opinar e decidir sobre os aspectos de sua formação educacional, saúde, religião e desenvolvimento como pessoa até que atinja a maioridade. Não há distinção entre brasileiros e estrangeiros nesse tocante. Trata-se, além do mais, de um direito da própria criança, de ter convívio com ambos os pais.

Este conjunto de garantias que se estendem aos estrangeiros serve também para assegurar que os mesmos, na hipótese de divórcio litigioso, por exemplo, tenham garantido o direito de lutar pela guarda e visitação de seu filho. Muitas vezes, quando o menor no Brasil reside, o âmbito da discussão da guarda e visitação do mesmo num processo de divórcio litigioso se limita ao Brasil. Talvez pela existência de um resquício e orgulho nacionalista, vários juízes se mostram adversos à possibilidade de o menor passar temporadas fora do Brasil para ver o seu pai estrangeiro, resultando em uma verdadeira negação de direito.

Há quem diga que esse tipo de atitude possui até mesmo um teor xenofóbico, de verdadeira aversão a um cidadão estrangeiro. Para uma criança em estágio formativo, nos seus primeiros anos de vida, não só é importante garantir o contato constante da mesma com o seu genitor materno e paterno, como mecanismo que auxilia a mesma na sua concepção de identidade como pessoa, mas como também preservar a sua herança cultural. A identidade de uma criança com suas figuras paternas são tão importantes quanto à identidade da mesma com as culturas de suas nacionalidades.

Infelizmente, tem-se visto que vários juízes não entendem as dificuldades inerentes a uma família internacional em um processo de divórcio litigioso. É muito comum não se considerar aspectos importantes na hora de se estabelecer um regime de visitação, como o pai que reside fora do Brasil e que encontra enormes dificuldades para visitar o país frequentemente, seja em virtude da distância, do preço das passagens ou por não conseguir dias de folga suficientes. Além disso, muitas vezes também a própria família estrangeira fica abandonada neste sentido, visto que muitas vezes as visitações no exterior são vedadas injustificadamente. A criança fica sem nenhum contato com tios e primos que não podem vir ao Brasil.

A alternativa recomendada por muitos juízes em relação ao problema acima são as conversas por Skype, que geralmente são estabelecidas algumas vezes por semana mas sem efetivamente suprir necessidades básicas mínimas de contato. Ocorre que o sistema judiciário nunca teve a infraestrutura suficiente para acompanhar o acontecimento destas conversas e muito menos forçar o cumprimento desta determinação pelo genitor que possui a guarda efetiva. Este é inclusive outro problema, onde a genitor guardião, sozinho com o menor no Brasil, pode influenciar o mesmo a se voltar contra o outro genitor ou até mesmo a temê-lo. Tal fenômeno é conhecido pelo nome de Alienação Parental, que inclusive é objeto de lei e visa o combate desta prática de distanciamento do menor emocional e fisicamente.

Muitas vezes a mãe ou o pai brasileiro temem que o menor, uma vez autorizado a viajar para o exterior, possam por lá ficar e não serem retornados. Todavia, negar pura e simplesmente o contato do menor com a sua cultura quando é possível que alguns acordos e medidas judiciais consigam eficazmente regular a questão pode significar a perda de experiências importantes na vida de uma criança. Esse receio, na verdade, é muito mais fundado quando a criança reside no exterior e vem ao Brasil para férias, vez que o país e o judiciário tem dificuldades em cumprir a Convenção de Haia acerca dos efeitos civis do sequestro internacional de menores, um tratado internacional que prevê ser o judiciário do país de residência do menor o apto para decidir a guarda e autorizações de mudança de domicílio.

Deve-se entender que para pais estrangeiros separados as dificuldades são maiores, em virtude da distância e diferenças culturais. Litigar em outro país é extremamente difícil para a maioria das pessoas. Desta forma, é necessária uma maior conscientização do judiciário brasileiro a respeito deste tema, ante o crescimento de famílias internacionais no Brasil e, como consequência, o crescimento de divórcios litigiosos onde a criança e o genitor estrangeiro podem ser prejudicados em direitos de convivência e direitos socioculturais.

Por Sergio Botinha
Raphael Delfino
Advogados Internacionalistas

Os Advogados supracitados são especialistas em Direito de Família Internacional e atuam no escritório Botinha e Cabral (www.advogadonobrasil.com).

Website: http://www.advogadonobrasil.com/
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