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QUARTA-FEIRA, 28 DE AGOSTO DE 2019 - Horário 13:08

Quais são os perigos do ‘Burnout’ - o fenômeno que tem adoecido os médicos do Brasil
Ciência & Saúde /

Quando se fala em condições da saúde no Brasil, geralmente são apontados fatores como as condições físicas dos hospitais, recursos financeiros e problemas com planos de saúde. Porém pouco se fala sobre o médico em si - o ser humano que vivencia e compõe o sistema de saúde, com problemas e que enfrenta horas longas de trabalho em uma profissão estressante e com cada vez menos reconhecimento financeiro e profissional.

Os médicos são particularmente afetados em relação a outras profissões por conta da natureza de seu trabalho, do estresse e da cultura médica de dedicação excessiva nem sempre bem remunerada e com reconhecimento.

Dra Siglia Diniz, médica e neurocientista, aponta que por conta de viverem no limite do cansaço, da pressão de uma profissão que lida com vida e morte, além do esgotamento por conta da sobrecarga de trabalho sendo visto como algo normal, muitos médicos sofrem do que se pode chamar de síndrome de estafa, ou mais conhecido como fenômeno ‘burnout’

Segundo dados do Conselho Federal de Medicina, 23,1% dos médicos manifestam burnout elevado. A médica alerta: esses dados são certamente subestimados por várias razões: difícil diagnóstico que diferencie o problema de outras possíveis condições clínicas concomitantes, baixo índice de médicos que reportam e assumem esse nível extremo de cansaço e pouco reconhecimento do burnout como uma ocorrência de saúde grave, com prejuízos a curto e longo prazo.

As razões, acrescenta Siglia, vêm de uma cultura que desde a faculdade de Medicina vangloria as horas prolongadas de estudo e trabalho e se prolonga durante o internato e a residência."Não existe orientação ao médico do ponto de vista de autocuidado e preservação", afirma

A ideia do médico ‘virar plantão’ e ficar dias sem sair do hospital é incentivada e esperada, porém, as consequências desastrosas a longo prazo para a qualidade da saúde pública entregue à sociedade e para a qualidade de vida desse profissional podem ser desastrosas. Alto índice de suicídios entre médicos, vícios como alcoolismo e drogas estão entre as principais já apontadas por recentes estudos feitos no Brasil e no mundo. 

No Brasil, apesar de não existirem estudos com abrangência nacional de casos, sabe-se que a incidência de suicídios entre médicos é três vezes maior do que o suicídio entre a população em geral, aponta Alexandrina Meleiro, doutora em Psiquiatra do Instituto de Psiquiatria da USP. Um estudo bastante relevante realizado pela Revista Brasileira de Saúde Ocupacional em 2018 (fonte aqui) trouxe a prevalência da Síndrome de Burnout entre as especialidades médicas. 

Na área da Oncologia, por exemplo, médicas apresentaram maior incidência de Burnout do que os profissionais do sexo masculino. Uma das razões possíveis? O fato de terem de dar conta de suas obrigações familiares e com filhos, o que influencia não apenas a sua qualidade de vida como sua longevidade também.

Apesar disso, Siglia aponta que não somente a especialidade, mas condições de trabalho, carga horária do profissional, seu reconhecimento e ambiente de trabalho, qualidade de vida pessoal e a própria forma como lida com o estresse crescente da sua demanda de trabalho determinam o surgimento do burnout e suas consequências.

Ela chama atenção para dados que indicam uma incidência em nível mundial, onde 1 em cada 2 médicos sofrem da Síndrome de Burnout, mais de 30% da classe médica como um todo é afetada pela forma moderada da síndrome e um décimo exibe a forma grave, apresentando danos irreparáveis em muitas situações.

As consequências não se referem apenas à qualidade de atendimento ao paciente e de vida do médico, mas também a uma perda financeira imensa por conta da exaustão desse profissional, que por sofrer dessa síndrome, pode não gerar um trabalho de qualidade, além de faltas constantes, erros médicos (que em países como EUA, por exemplo, geram milhões de dólares em custos legais em processos judiciais), perda de profissionais que ou morrem mais cedo ou abandonam a profissão prematuramente para seguirem outras profissões ou por conta de doenças e vícios.

Dra. Siglia alerta: a mudança na cultura médica é crucial e precisa começar na formação do médico, incutindo a necessidade de autocuidado e preservação da saúde mental e emocional como fator primordial para uma excelente assistência de saúde a pacientes - isso acaba favorecendo a qualidade do sistema de saúde como um todo.

E quais rotinas podem melhorar a saúde de um médico e diminuir as chances de um burnout? 

Atividade física e alimentação, cultivar hobbies, vida social e ter atividades fora da atividade médica são essenciais e podem inclusive aumentar sua criatividade e memória cognitiva (o que ao final ajudará também sua profissão). Práticas que condicionem o cérebro a sair da zona de estresse, como meditação e yoga trazem tranquilidade imediata e podem ajudar esses profissionais em suas atividades diárias, principalmente se associadas a uma boa rotina de sono e autocuidados. 

Além disso, "getaways" (pequenas saídas de 3, 4 dias de tempos em tempos em vez de esperar pelas férias) ajudam o corpo e a mente a se recuperarem, e assim aumentar a produtividade e qualidade de vida, evitando inclusive o isolamento que ocorre com médicos que entram em rotinas de longas horas de trabalho e que deixam de lado atividades sociais e interpessoais importantes para o bem-estar da mente e do corpo. 

Pensando em ajudar profissionais da área, Siglia elaborou um ebook com mais práticas e recomendações sobre isso que pode ser acessado aquiwww.drasigliadiniz.com/e-book-gratuito

Referências:

  1. Desvendando o Burn-out: Uma análise interdisciplinar da Síndrome do Esgotamento Profissional. Marcos Henrique Mendanha, Pablo Ferreira Bernardes, Pedro Shiozawa – São Paulo: LTr, 2018.  
  2. Síndrome de Burnout em médicos: uma revisão sistemática. Revista Brasileira de Saúde Ocupacional, 2018.
  3. Annals of Internal Medicine - MEDICINE AND PUBLIC ISSUES |4 JUNE 2019 -Estimating the Attributable Cost of Physician Burnout in the United States; Shasha Han, MS; Tait D. Shanafelt, MD; Christine A. Sinsky, MD; Karim M. Awad, MD; Liselotte N. Dyrbye, MD, MHPE; Lynne C. Fiscus, MD, MPH; Mickey Trockel, MD; Joel Goh, PhD   


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